quarta-feira, janeiro 26, 2005

Abomino todos aqueles que julgam existir para além do seu próprio espaço. Odeio aqueles que pensam que existem, que existem em si próprios, e que julgam existir nos outros, pensando assim existirem neles, entre eles e para além deles. Odeio-me a mim prório igualmente, e nem por isso, e então nem sei, porque o próprio sentir não existe. Não escrevo para existir desta forma, ou para existir de qualquer outra. Escrevo porque é o que estou a fazer neste preciso momento. Sem justificações, razões ou motivos de qualquer espécie. Não gosto de nada nem vejo qualquer utilidade nisso, e ao mesmo tempo não sei se gosto, nem do quê porque não sei se tal existe. Nem sequer no próprio conceito de utilidade em si, ou sequer palavras, pensamentos, enfim, o que quer que seja. Cultivar um egozinho que muitos pensam existir porque pensarem existir neles próprios? Não. Nem busco sonhos, nem projectos nem objectivos, nem sentimentos, porque estes não existem. As próprias sensações não existem. São desmistificados até às mais que esbatidas fronteiras da curiosidade, que por sua vez não existem. Pensamos que sim, mas não, e nem isso se pode dizer pois nem o não pode, nem o não existe, existem, e nem sequer o próprio existir, existirá, ou não. Tudo é subjectivo. Até um facto, um objecto.., até um átomo. Tudo e nada ao mesmo tempo. Só escrevo estas palavras porque... se vão escrevendo... e não escrevi nada ao fim ao cabo.. ou sim, talvez, não, depende.. não sei...

terça-feira, janeiro 25, 2005

Crónica matinal

Não me quero perceber a mim, nem os quero perceber a eles. Simplesmente não existem. Ninguém existe à minha volta. Nada me atormenta. São apenas formas indistintas, cheiros neutros, imagens sem cor que vagueiam por aí, errantes no tempo e no espaço. Cada um tem o seu. Eu tenho o meu, porque tenho mesmo que tê-lo. Porque existo e tenho que ocupá-lo para circular, para me movimentar. A culpa é do cão. Ofereceram-me um há uns meses. É um daqueles irrequietos, que se mexe constantemente, e eu lá o tenho de ir passeando, com uma trela. Por vezes tenho de levá-lo à rua, preso pela mão para que ele não possa fugir. Ainda aqui à dias, distraí-me e ele soltou-se. Correu desenfreadamente até à estrada, ainda fui a correr atrás dele para apanhá-lo, mas já não havia nada a fazer: veio um carro e apanhou-o em cheio no lombo, projectando-o a uns bons três metros de distância. Pensei que tinha mesmo sido desta que o animal ìa desta para melhor, e por minha culpa. O condutor do veículo nada podia fazer, pois o animal soltou-se por entre vários carros estacionados, e ele nem teve sequer tempo de travar e reduzir a marcha. Nem sequer parou, coitado, deve ter entrado em estado de choque, pois não estava concerteza à espera que lhe aparecesse súbitamente assim um bicho à frente, vindo do nada, enquanto conduzia calmamente, ao ritmo da sua vidinha. Continuou até ao cruzamento, e desapareceu. Pus as mãos à cabeça, e deseperado soltei bem alto uma série de palavrões. O animal, levantou-se e meio a coxear foi-se esconder atrás de uns arbusto, com vergonha. Chamei por ele mas nada. Lá o descobri, por fim. Olhou para mim envergonhado, receando uma repreensão severa da minha parte. Não lhe disse nada, e estava eu próprio em choque, convecido que ele ía mesmo morrer, e por negligência minha. Levei-o para casa, num táxi, e pu-lo na cozinha, coberto com mantas. Tratei de uma ferida que tinha na perna, com betadine, e liguei a um veterinário, para que me pudesse ajudar. Estava fechado aquela hora, mas lá me foi dizendo que aquilo podia não ser grave, pois o seu próprio cão já tinha passado por uma situação semelhante, e havia sobrevivido sem mazelas. Disse no entanto para passar por lá de manhã, e tirar umas radiografias. Sempre fiquei mais sossegado, embora ainda muito nervoso. No dia seguinte o cão já se levantava, caminhava até, embora coxeando de uma pata, e engolia àvidamente os biscoitos que lhe ía dando. Não cheguei a ir ao veterinário. Hoje, passado umas semanas, está como novo. Não ganhei para o susto. Espreguiço-me e vou à casa de banho. Não resito a olhar-me ao espelho, embora me arrependa sempre no final. Não posso deixar de reparar que tenho as pupilas extremamente dilatadas. A pele não está branca e luminosa, como esperaria. Lá fora,um condutor apita frenéticamente, mesmo por baixo da janela do meu quarto. Abro a janela finalmente, e sou inundado pela luz do sol. Reparo na enorme fila de trânsito provocada por um autocarro que por ali empancou. O condutor, aqui já reparo que se trata de uma condutora, continua a apitar. Grito-lhe igualmente uns impropérios mudos, já que devia saber que daquela forma não vai conseguir resolver nada. Além do mais, aquele apito constante enerva qualquer um. Por esta hora já deve ter acordado a vizinhança toda. Porque será que as pesoas se sentem na obrigção de projectar o seu sofrimento nos outros? Não lhe chega a ela própria estar irritada, que se sente logo na obrigação de irritar todos em sua volta também? Reparo nos outros condutores, que apesar de igualmente perturbados, vão-se controlando e não tomam parte naquele show-off. Terão-lhe-ão agora concerteza mais ódio a ela, do que ao próprio condutor do atucarro. Desço para tomar o pequeno almoço. Reparo que voltei a colocar demasiados cereais dentro da tijela. Sei que não os vou conseguir comer a todos, e depois vou ter de vazar o resto no lixo. E é um desperdício fatal, pois os poucos que restam na embalagem não chegarão para uma refeição completa. Evitando este desperdício, chegariam perfeitamente. Subo aos pisos de cima e reparo que já todos se levantaram. Todos não: A Joana ainda dorme. Mas ela é também uma errante, e está em fase de recuperação, o que se desculpa. Para além do mais, dorme sempre o número de horas regulamentares, ou até mais, e deita-se cedo. O único vício dela é mesmo o excesso de televisão. O trânsito já parece circular normalmente. Já acabei o leite, mas reparo que ainda tenho a tijela quase meia de cereais. Que desperdício! Ou os deito fora, ou terei de voltar à cozinha para meter mais leite. Vou ficar empanturrado. Mas que se lixe. Chego ao frigorífico, e reparo que o último pacote foi para o lixo. Vou ter de abrir outro, só por causa deste bocadinho. Já temos poucos, e como aqui ninguém anda bem de dinheiro devia racionalizá-lo. Abri-o na mesma. Tirei o necessário e voltei a subir. Pelo caminho reparo na imagem de uma criatura frágil a ser brutalmente espancada pela polícia. É para repôr a lei e a ordem, diz o pivôt do noticiário, como se fossem os próprios porta-vozes dessa lei e dessa ordem, feita por políticos corruptos, que se prostituem cada um de acordo com os seus interesses. Ainda hoje morreram não sei quantos em Bagdad, e por cá a pré-campanha eleitoral está ao rubro. O mundo gira todo ao contrário. Acendo mais um cigarro. Antes tinha receio de fumar em jejum. Agora espeto-lhe com três logo de seguida, só porque me sabe bem. Afinal voltaram a sobrar cereais, mas já estou cheio e não vou voltar a descer. Devia aproveitar a moleza daqui resultante, para me voltar a deitar, e recuperar o número de horas de sono perdidas. Hoje queria acordar fresquinho, para ir trabalhar, para me dedicar a coisas que dizem ser importantes, e determinantes para o nosso futuro: os estudos. E por mais que eu fuja deles a sete pés, lá me vou começando a convencer que é verdade, e que vou mesmo acabar, um dia, por começar a gostar deles. Ouço o autocarro a passar novamente. Desta vez, sem problemas. Abro a janela, e reparo que a rua está deserta. Apenas um carro ou outro, vai passando de vez em quando. A joana acordou agora. Já a ouço abrir as janelas e barulho na casa de banho, que fica aqui mesmo ao lado do meu quarto. Quanto a mim, depois de um curto raciocínio, decido dormir mais um pouco. Não me sinto ainda suficientemente desperto para começar o dia. Farei os meus deveres depois mais tarde.

segunda-feira, janeiro 24, 2005

Just Perfect!

Perfect Day


Just a perfect day
drink Sangria in the park
And then later
when it gets dark, we go home

Just a perfect day
feed animals in the zoo
Then later
a movie, too, and then home

Oh, it's such a perfect day
I'm glad I spend it with you
Oh, such a perfect day
You just keep me hanging on
You just keep me hanging on

Just a perfect day
problems all left alone
Weekenders on our own
it's such fun

Just a perfect day
you made me forget myself
I thought I was
someone else, someone good

Oh, it's such a perfect day
I'm glad I spent it with you
Oh, such a perfect day
You just keep me hanging on
You just keep me hanging on

You're going to reap just what you sow
You're going to reap just what you sow
You're going to reap just what you sow
You're going to reap just what you sow


Lou Reed
Pois é.. Depois do título do últim post, lembrei-me.
Não tem nehum significado especial. É mesmo só porque hoje foi um perfect day.

Beautifull day!



E pronto, é mesmo isso.
Está um dia maravilhoso, o mundo é lindo,
e viver é a melhor coisa que nos podia ter acontecido a todos.

Por isso malta, vamos lá a animar!!!
A vida são dois dias, temos mais é que aproveitar.
E já passámos um deles de trombas caídas...

Toca a partir..!!!
hoje bem não desejo édipo intensivo tormenta antes alívio peso toneladas ombros não pesa disposição não espera rejuvenescer menos anos problemas cansaço reprimido auto-destrutivo recuperado não totalmente tempo tudo perdido meses anos tentativa recentemente pontas pendentes notas mentais finalmente médico tormento grave espera novo pragmatismo sísifo aperto mão sorriso inimigo não amena briga cavaqueira cumprimentar sempre mais não beber cerveja não fumar combina juntos exemplo ninguém podia não mencionar não resolver não calha dar qualquer coisa senão antes nunca sozinho narciso volta amigos hipócritas humanos egoístas sorrisos satisfação todos mundo inteiro energia sombra vazia fechada escondida assustadora um rosto convivemos coexistimos não preciso ocasiões vida normal alegria tristeza solidariedade isolamento nós eu outros um só pior ontem

manhãs sonos sonhos trocados dias oportunidades horários tardes normais lojas locais trabalhos horas menos uns resolver também semanas passadas deixa amanhã encerrava vez foi pensar pesar minutos casa rua nua noites

meias botas roupa chata novas detestar compras caminho razões discussões tempo paciência gosto apenas fica bem luva identificar confiar transmitir personalidade imagem alma espírito pessoa ideias ideais peça cor adereço limpo despreocupado estilo aquele outro nunca fácil decisões vida estúpido adiado excedido meses anos limites resistência preservar durar mesmo mais difícil encontrar projectar erros fatal jogo peça perfeita olhar imaginar vestir casaco calças camisas botas pele sempre acompanhar lado custa consigo comprar peça paixão caixão vista vida instantânea morte atenção súbita flash perfeita imagem roupa tempo teste prova bem não ficar esperar fugir esquecer saltar morrer moldar corpo gasto gosto roupeiro casa velho novo transição lenta demorada reter amor ódio comprar vender roupa não despertar automaticamente sentimento aquela compra perfeita mente nunca compro roupa não hesitar minuto devo não comprar não instantâneo verde montra loja vista número preto pouco encanto semelhante não casa assunto troca loja voltar experimentar verde click aquela marca perfeita remendos buracos não aguenta mais eu vida pés frios alma sorriso mundo passagem anos processo vir repetir situações roupa carro casa emprego coisa básica música filme livro pessoas complicações implicadas párar complicadas medidas vazias


nada agora tarde eu dormir dia fantástico contrário o ontem altura ainda mais negro minha vida fundo hoje daqui positivo dali negativo sono dia fim semana certo diabo prazer desmedir ter trocados viver noite levantar outros jantar tempo tarde cansados deitar dormir sonho beleza entusiamo acordar desesperar esperar depois deitar aproveitar esquecer espaço tempo esplendor sensação recordação raiva inquietide calma plenitude imaginar ignorar ter mundo nós sair 4h30 madrugada deleitar beleza paisagem há muito

Escuridão da noite. Uma cidade. Viajo. Penumbra. Obscuridade. Trevas. Não se vê viva alma. Sozinho. Só nós. Só eu e o mundo. É um sentimento fantástico, maravilhoso... A liberdade de ter a estrada toda por minha conta, poder ocupar a faixa do lado e circular pelo meio.., passar os semáforos vermelhos a alta velocidade sem um pingo de preocupação... olhar os edifícios, os monumentos, e pensar que aquele momento é meu... sou dono de tudo que está ao alcance do meu pensamento... a esta hora não há mais ninguém aqui por perto... Sou livre! À noite, tudo é gigantescamente maior e mais poderoso. mais intenso. mais natural. mais belo. mais puro. Durante a madrugada, quando todos os outros dormem, saío à rua e a cidade é minha... circulo com toda a liberdade... apenas eu e ela. O mundo inteiro é meu... uma infinidade de espaços por descobrir...e tudo isto é pena...tenho de pôr o sono em dia. Amo perdidamente o silêncio, harmonia.. e a plenitude, que me traz a solidão da noite... É durante a noite que nos apercebemos verdadeiramente da beleza (i)real das coisas...

Devo dormir. É tarde para mim. A hora não perdoa..


subitamente

acordo


ontem...

domingo, janeiro 23, 2005

Devaneio Último

Grandessíssimo filho da puta! Sinto. Pena. Paciência. Não consegui contornar, e deixei-me levar na escrita... Sublinho contudo, não ter tido intenção de provocar acidentes. Era particular. A questão estava centrada em mim. Era interior. Uma pulsão destrutiva levava-me a fazê-lo. Mas aconteceu. Não havia alternativa. Posso parecer irracional. Egoísta. Admito. Seria preferível ter escrito sobre outros temas, outras encarnações. Talvez. Teria por ventura outro final. Mais silêncio. Menos tensão. Alguém entrou sem permissão. Aparentemente parece estar agora tudo bem. Mas não. Ficou qualquer coisa. Uma sensação. Uma imagem. Um olhar. Céptico, desconfiado, revoltado... E a imagem, ausente, distante, indiferente. Permanece ancorada lá no fundo. Espero pelo tempo... Desespero... Extravazo inconscientemente. Perco-me progressivamente. Não controlo. A loucura escapa-se-me cá para fora ruidosamente... A alienação toma-me a existência por completo. A catástrofe é eminente... Desisto... Quando dou pelas horas, o despertador já tocou. Acordo. O pânico assalta-me. Afinal não estava a dormir. Não tenho objectivos. Nem motivações realistas. Embora a questão sempre tenha estado escondida por detrás das formalidades protocolares. Fujo. Tenho vergonha. A minha imagem repugna-me. Não quero mais agir. Vou-me limitar a coexistir. À minha volta formou-se uma nuvem cinzenta. Com o tempo, atingiu os limites do insuportável. Não só não me consigo compreender, como me vou deixando despreocupadamente perpetuar sem pensar nas consequências finais. Irreversível. Um final que não impressiona. Nem sequer o tento mais analisar. O tempo. Cura milagrosa que me vem salvar quando tudo o resto falha. Parece um raciocínio lógico e linear... Vendo a alma ao diabo, admito a derrota, invento uma desculpa e saio sorrateiramente pela porta dos fundos. Começarei de novo. Regressarei ao zero. Farei tábua raza de tudo. Imaginarei continuar a existir. Serei gelo, éter, vazio, buraco negro... A vida é uma viagem. Meto-me ao caminho sem bagagem. Circulo rápidamente. Chamam-me. Inconsciente, mendigo, cobarde, vadio, vagabundo.. Apenas um corpo e um saco vazio. Aqui cabem todas as memórias. Se corre é porque é ladrão. Ciclos que se repetem. Tentei a todo o custo evitar o caminho de regresso. O confronto é catastrófico. Não admiti o fracasso. Uma simples constatação lógica. Adiar eternamente os factos. Queria viver desligado de tudo e de todos. Essa parecia ser a solução ideal... Pela estrada fora caminho. Um novo recomeço. Uma segunda oportunidade, uma diferente reencarnação, uma realidade paralela... Em breve estarei no meio de uma multidão de desconhecidos, e aí, sentir-me-ei seguro. Rezo para que os dias passem rápidamente. Desejaria tornar-me invisível. Tremo de desconfiança perante quem passa. Pedem-me um nome. Não falo por gestos, muito menos por palavras. Evito o olhar. Afasto-os pela distância. Finalmente vão embora, murmurando. Agora sou eu quem escolhe. Não me importa o que possam pensar. No dia seguinte já não se lembrarão. Um imenso deserto. Nada há a ganhar, quando se admite ter perdido. Solidão amiga. És tu que me corróis a alma. Protege-me dos seres decadentes. Mutações hormonais, bichos primitivos, corpos sem espírito, animalescos instintos, que me traem constantemente... Coexistem, cruzam-se, interagem... São sono sem sonho, ilusões sem fantasia... Pudesses tu trazer-me de volta tudo o que perdi. Não me quero voltar a trair a mim próprio! Serei invencível, de pedra, inquebrável... Rio-me... Uma ânsia descontrolada assalta-me constantemente.. Rasga-me por dentro. Olho para o chão, e vejo um imenso lago de sangue à minha volta... Levo as mãos ao peito, tentando estancar a hemorragia... O sangue jorra-me por entre os dedos... A mão afunda-se lentamente dentro do peito... Um enorme buraco. Palpo um osso que me parece ser uma costela, toco um tecido estranho que me parece ser um pulmão.. enterro a mão e tento alcançar o coração para ver se ainda bate... tento deixá-lo no mesmo sítio, retiro a mão bruscamente, tento fechar o peito deseperadamente... Queria eu acordar agora e que tudo isto fosse apenas um sonho... Desisto... Sinto que é o fim, que vai acabar a qualquer momento.. Deito-me, fecho os olhos. Espero que tudo termine rápidamente... A madrugada é um universo estranho. Um sono-sonho, que é nada, e parece representar tudo. Um olhar. Um sorriso. Uma lágrima. Anos, meses, semanas, dias, horas, minutos passados sem que o tempo avance. Um pesadelo interminável... Consigo manter-me distante de tudo, menos de mim próprio. As imagens continuam cravadas na mente... Queria fugir do meu universo, arrepiar caminho.. Queria fugir para sempre por um atalho obscuro sem mapa de regresso.. Ouço vozes. Palavras que me parecem despertar. O tempo traz-me de volta.. Eram apenas alucinações. O tempo, esse carrasco do destino, que volta sempre para me julgar... Desaparece súbitamente. Arrumo tudo num cantinho, bem recalcado, e pretendo esquecer. Vou continuar infinitamente a adiar...Até ao dia em que o cansaço me deixar dormir. Noites passadas. Brancas. Queria despertar novamente. Odeio relógios, calendários. Não me dou com eles, nem eles comigo. Não lhes darei o prazer de desistir novamente.. Nunca lhes voltarei a pedir perdão. O destino é implacável... Enquanto isso, vou escrevendo umas frases no quarto para passar o tempo.. Depois apetece-me partir tudo, arrancar a tinta das paredes... Uns riscos por cima, e tento camuflar as palavras, tornando-as imperceptíveis. No final, um imenso borrão, que se reflecte numa pintura caótica, sem ponta por onde se lhe pegue... Não há nada a fazer. Não sobra tinta para pintar, e já é tarde demais para se conseguir apagar. Tento esquecer este ciclo vicioso, e saio de casa. Já é dia. Mas tudo é tão diferente agora. Olho as paredes da rua, brancas, limpas, lisas.. Agonio-me... Vomito. Droga! Apetecia-me riscar tudo à minha volta. Pego numa pedra de calçada e atiro-a contra uma esquadra. Um polícia corre atrás de mim. Fujo e escondo-me rápidamente atrás de uma esquina. Maldito! Reflicto. Perdi a razão. Um dia, quando me esquecer, repetirei tudo. Não consigo fugir definitivamente de mim próprio. Queria pensar que tudo acabou. Mas o infinito é muito tempo. O tempo não tem fim. Tentarei esconder-me. Uns momentos de sobriedade serão suficientes. Depois voltarei a esfaquear-me novamente... É um ciclo. A minha voz irrita-me. O meu cheiro repugna-me. As minhas conversas, aborrecem-me de tédio. E o sabor do meu sangue faz-me vomitar. Sinto-me desfalecer. Perco os sentidos... Esse momento chegou. Os sinos tocam as sete da manhã, e eu sei que aquela era a última vez. Que o relógio está em contagem decrescente... Perdi a oportunidade. Deito-me rendido. Fecho os olhos e tento adormecer. Não espero pelo dia. Baixo as persianas. Não quero ver o sol! Não sairei à rua. Todas as noites são noites diferentes. Todas as sensações são sensações diferentes. Toda a realidade é uma realidade diferente. Cada um tem a sua própria percepção dos acontecimentos. Eu tenho esta e não consigo perceber porquê. Eram impressões instintivas e incompreensíveis nos primeiros tempos. Pareciam passageiras. Pouco determinantes. Depois, numa fase posterior vejo-me forçado a lutar contra elas. Emprego todas as minhas forças para não me render ao abismo... Um dia dei por mim a exorcisar fotografias antigas. Tentando apagar os momentos decisivos. Decidi agora descansar um pouco. Perdi-me por completo. Á deriva no oceano do caos. Limito-me a aguardar o final do mais estranho período da minha vida. Apesar de tudo houve aspectos positivos. Consegui-me libertar da razão pura. Fui livre por momentos. Acreditei viver um sonho, por instantes. E no final, consegui tirar algum prazer do sofrimento... Paguei a minha pena, e fiquei um pouco mais aliviado. Mas nos momentos marcantes, tudo se volta a repetir. Aprenderei a suportar tudo isso. Amarei a calma, a harmonia, o sangue frio. Um dia ficarei sozinho. Saberei aguardar a libertação. Até lá existirei sem dizer nem mais uma palavra.

Um dia entenderei tudo isto...

Adeus

Até esse dia...

Livro do Desassossego (144)

"Tenho mais pena dos que sonham o provável, o legítimo e o próximo, do que os que devaneiam sobre o longínquo e o estranho. Os que sonham grandemente, ou são doidos e acreditam no que sonham e são felizes, ou são devaneadores simples para quem o devaneio é uma música da alma, que os embala sem lhes dizer nada. Mas o que sonha o possível tem a possibilidade real da verdadeira desilusão. Não me pode pesar muito ter deixado de ser imperador romano, mas pode doer-me o nunca ter sequer falado à costureira que, cerca das nove horas, volta sempre à esquina da direita. O sonho que nos promete o impossível já nisso nos priva dele, mas o sonho que nos promete o possível intromete-se com a própria vida e delega nela a sua solução. Um vive exclusivo e independente; o outro submisso das contingências do que acontece.Por isso amo as paisagens impossíveis e as grandes áreas desertas dos plainos onde nunca estarei. As épocas históricas passadas são de pura maravilha, pois desde logo não posso supor que se realizarão comigo. Durmo quando sonho o que não há; vou despertar quando sonho o que pode haver.

Debruço-me, de uma das janelas de sacada do escritório abandonado ao meio-dia, sobre a rua onde a minha distracção sente movimentos de gente nos olhos, e os não vê, da distância da meditação. Durmo sobre os cotovelos onde o corrimão me dói, e sei de nada com um grande prometimento. Os pormenores da rua parada onde muitos andam destacam-se-me com um afastamento mental: os caixotes apinhados na carroça, os sacos à porta do armazém do outro, e, na montra mais afastada da mercearia da esquina, o vislumbre das garrafas daquele vinho do Porto que sonho que ninguém pode comprar. Isola-se-me o espírito de metade da matéria. Investigo com a imaginação. A gente que passa na rua é sempre a mesma que passou há pouco, é sempre o aspecto flutuante de alguém, nódoas de movimento, vozes de incerteza, coisas que passam e não chegam a acontecer.A notação com a consciência dos sentidos, antes que com os mesmos sentidos... A possibilidade de outras coisas... E, de repennte, soa, de detrás de mim no escritório, a vinda metafisicamente abrupta do moço. Sinto que o poderia matar por me interromper o que eu não estava pensando. Olho-o, voltando-me, com um silêncio cheio de ódio, escuto antecipadamente, numa tensão de homicídio latente, a voz que ele vai usar para me dizer qualquer coisa. Ele sorri do fundo da casa e dá-me as boas-tarde em voz alta. Odeio-o como ao universo. Tenho os olhos pesados de supor. "

Bernardo Soares

sábado, janeiro 22, 2005

The Czars


Val

Emptiness, emptiness how do I search for you
Empty everything and strip the walls
make them colorless, invisible
stop all thought, I am not losing now
I can't feel anything, I can't see you

Chorus:

Try and make me go away tonight, try and make yourself pretend
I wanted it, I needed it, for the longest time
try and make yourself pretend, you can't go on tonight
I wanted it, I needed it for the longest time

Chorus:

I don't want to do this anymore, I don't want to hear your voice
I wanted it, I needed it, for the longest time
You don't even have to want, you don't even have to care
I wanted it, I needed it
for the longest time


The Czars
(written by John Grant)

Comsat Angels


.

Eye Of The Lent

I'm walking down a street where children play
When they see me they run away
She will not look at me, she won't say why
And when I ask her she just cries

No-one will talk to me, they turn to go
Their faces say there's something I should know
Could I be a victim of the games of all my friends
Or am I really being watched by the eye of the lens

My world is empty now, no-one comes near
No-one can stand the smell of fear
Hours pass so slowly, time beats a drum
As I wait for what I hope won't come

No-one will talk to me, they turn to go
Their faces say there's something I should know
Could I be a victim of the games of all my friends
Or am I really being watched by the eye of the lens
Something's coming closer, I can only stare
The scream of silence fills the air
I was not a victim of the games of all my friends
Now I find myself behind the eye of the lens...

.

Dark Parade


He looks up
Straight ahead
Theres something there
Now it's gone
Is it a bird
Or an aeroplane
Just like a thought
It's there
Then it's gone

Over sea
And over sand
In the deserted heart
Of a desert land
Rotor blades
Like a charred palm trees
Signify
No success
No release

It it eight
Or is it nine
Who fall in
For the very last time
There is no rest
No release
At the oasis
These men
Reduced to this
The darkest parade


Para ouvir, só encontrei a independence day . Não era bem isto, mas foi o que se conseguiu arranjar.

Mind drawings



May have several different interpretations

Damn, I'm I stupid...

Should I writte?
What the hell am I doing?

AAAAARRRRRRRRRRRRGGGGGGGGGHHHH!!!!!!!!!!!!!!!!!!

You FUCKIN ASSHOLL!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Why the fuck do I have to be always interfiering,
putting myself in other people's way?????

Why can´t I keep my big mouth shut?


I´m such a piece of sheat...


aaaaaaahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh..., FUCK!!!!!!!!!!!!!

(Thank god I don´t have money in my celular. I wonder why is that?)

Demência

E pronto, lá se foram todos os paninhos quentes, e a merda do existencialismo racionalista a que recorria constantemente (quando convinha provar que se estava a melhorar), tipo comprimidos para crises de demência que me davam de vez em quando, e blá blá blá, para o caralho... Lá se vai todo o trabalho que tive, para, depois desta merda se ter tornado do conhecimento público (com a perda do anonimato), me manter nos limites do razoável, do isento e do dúbio (e conseguir andar na rua). Lá se vai toda a minha segurança. Agora já sabem que sou doente e que escrevo estas merdas. A verdade é esta: Estou doente. Mais. Estou demente. O meu subconsciente tomou a sala de controlo. Eu sei que a culpa não me é alheia, e que ninguém contribuiu para que esta merda acontecesse. Mas aconteceu. E por muito que me tenha tentado convencer de que isto com o tempo, eventualmente irá passar, a verdade é que até agora não passou. Já lá vão meses, senão anos. E mudar parece que não foi solução. Fugir também não, porque não se pode desaparecer eternamente. Passará, eventualmente, mas se para isso vou ter de continuar por tempos infindáveis com este pensamento torturante constantemente no pensamento, então mais valeia fazê-lo de uma vez por todas e ignorar todas as más consequências que daí possam advir... A única razão pela qual não o fiz antes, foi única e exclusivamente porque não quero prejudicar ninguém com isto. Se o fizer realmente, só espero que não seja mal interpretado, e que me ignorem. É que eu já devia ter esquecido esta merda. Se conseguisse pô-lo em prática, não demorararia muito tempo... Mas não. Depois apercebo-me de que já não há margem de manobra para reflexões de última hora. Não há-de ser nada.

Desespero

Estou a dar em maluco. Não naquele sentido irónico, mas louco no sentido patológico. A pouco tempo de um compromisso importantíssimo, não só não consegui dormir, como não preparei absolutamente NADA. Limitei-me a desistir. Estou completamente fora de mim. Só consigo pensar.. em problemas existenciais. Arrrrrrghhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!! Se eu não resolvo acabar com isto de uma vez por todas vou EXPLODIR!!!!!!!!!!!!! E o pior é que não sei o que faça para resolvê-lo. Não sei mesmo. Porque será que não consigo fazê-lo uma vez na vida? Mesmo que faça figura de urso, mesmo que passe por desiquilibrado, despropositado, impertinente, indecente, perturbador.., da ordem natural das coisas.., chato, descabido, ridículo, infantil... isto tem que ser feito. Senão vou-me recriminar o resto da minha vida. E quando digo o resto, quero mesmo dizer até ao último dia. Acho que nunca estive assim... acho não. Tenho a certeza que nunca me deu assim com tanta força. Espero que compreendam... Tipo só precisava de uma resposta... Fosse ela qual fosse. Deêm-me o desconto, e esqueçam. Mas assim é que não posso continuar.. Assim desta forma é que não. NÃO AGUENTO MAIS!!!!

Looking at the window



sexta-feira, janeiro 21, 2005

Era bom...





Que o tempo voltasse para trás...

Podería corrigir todos os erros da minha vida,
da mesma forma que vou emendando

no edit as palvras.

Mas não quer dizer, que mesmo assim,

as coisas fossem ser radicalmente diferentes.


E já era tempo de saber que não volta.

Por isso...

Mão Morta


E se depois

E se depois
O sangue ainda correr
Corre atrás dele

E se depois
O fogo te perseguir
Aquece-te nele

E se depois
O desejo persistir
Consome-te nele

E se depois
O sangue ainda correr
Corre atrás dele

E se depois
E se depois

[Zé dos Eclipses / Zé dos Eclipses - Miguel Pedro]


Mão Morta (Do primeiro albúm, homónimo.)



Os ses não existem...



E se depois...

Memories




Just let them go..!

segunda-feira, janeiro 17, 2005

Inverno

A paranóia já passou... Afinal, ninguém deu por ela, e isso parece ser o suficiente para continuar. Inventei cenários surreais que procuram ser apenas ficção, equívocos. Assim, este anonimato justifica a acomodação assimilada. Talvez por isso, continuo a escrever. Mas já não tenho a confidencialidade plenamente garantida. Precisaria disso. Se ao menos tivesse essa certeza, já seria pelo menos, um passo em frente... E o pior é que não quero deixar de aqui existir definitivamente, pelo menos para já. E se apenas eu narccísicamente existo, porquê esta sensação de coexistência? Um dia desaparecerei, para sempre, com alívio. O único problema parece ser o arbítrio. Decido apenas não decidir nada, à deriva de uma neutralidade alheia ao exterior em geral...


O princípio do ano deixa-me deprimido. Não sei se é isso, ou se é o facto de estar a chegar aos trinta. Há quem fale de crises de meia idade e essas coisa. Eu tenho crises, é verdade, mas não sei se lhes chamaria isso. São isso sim, crises de sociedade. Deve ser do Inverno, já que parece surgir todos os anos por esta altura. Não me parece que os meus problemas tenham a ver com personalidade, identidade ou qualquer dessas dúvidas em relação a mim próprio. Não é qualquer espécie de frustração, porque não se pode sair derrotado quando não se tem esperança de ganhar, e quando se sabe que nada há para ganhar. Depois de inúmeras tentativas, por muito abstractas que possam parecer, apenas me faço acompanhar de um existencialismo realista, no final. Sóbrio, o tempo todo. Existir, por si só.., isso parece ser suficiente. As coisas reais, quotidianas, como os objectos e os objectivos, parecem pefeitamente alcançáveis, pois tenho em consideração apenas, os que não dependem de ninguém, senão exclusivamente de mim. Não há circunstância nenhuma exterior, que neste momento me pudesse acrescentar qualquer coisa de positivo. Muito pelo contrário. A esperança, não existe. Pode ser que desapareça, ou apareça, ou surja outra situação qualquer. E só resta mesmo apagar as sombras da esperança, para me poder realizar plenamente... Sem ânsias nem deseperos, vivo alheio a tudo e todos, únicamente em função do facto concreto. E isto poderá significar ser-se feliz, pois tudo existe (em nós próprios) e nada se perdeu. Só o existir é real. Tudo o resto se evapora, se ignora.., desaparece... No final, permanece o eu. Sozinho, natural, na sua forma pura.., um nada que é tudo, no fundo.


quinta-feira, janeiro 13, 2005

The cure

That was clear enough, thank you. I understand your position. Can you really believe that I feel finally free from myself? Thanks for helping me cleaning this mess. I really needed this. But in the end, this was a fine day. Life should come around soon. All that I can say is, that I needed to hear your goodbye before leaving this place. From now on, I will make some new arrangements. I´ll try to forget the main subject. All I have to do now is concentrate on work. You will not see it, cause you´ll have to go away, I already know that. This is a sick weardo´s place. You should already know it. People can easily get scared, impressed, confused, and...then they puke. Hell, but I felt good while smoking that sheat, even if throwing all my dinner away, in the end. Someday you´ll understand. Sometimes we have the oportunity. Don´t think that it's so bad. It really feels good. All regrets turn to dust. Then we smoke it and everything is gone forever. It´s a one way ticket, for only those who don´t want to come back. I always did want, every single time. Main point is: Were cool with each other, and that´s ok! I´ve learned to forgive myself, and these thinkings were all about it. You're right. Let's forget it, and let it all go away. I'll stay away, from now on. And I'll be fine. I was just fooly enloved, that was it.

And guess what? I also reallise that I still can write in english. Were there many errors in this thing? Pfuuu... an endless list. Never mind that. I won´t bother no more. And who gives a shit anyway? I used to. Always did. I'll get over it. I always took good care of myself. Never lost control. What about you? You seem pretty sure of what you want. You always did. Go back to work, or study, or him, or whatever you're wish to... Buy the new things you wish, weare them, and then take a deep look to yourself in the mirror. You´ll look just great, and as happy as you can be. You´ll see, and they will to. Somewhere between your own, you'll find him.

By the way, if you´re thinking just now that this text is ment for you, be aware... That means you are getting paranoid...



Ps: Don´t panick! All that is reversible. No, not that.., You already told me that. I know you don´t like these words. So, just don´t read it anymore. That should be enough... Me? I´m as good as new. I´ll rock!



20/04/2002

Acordando




Fora das rotas da noite, por esta hora levanto-me. Prisioneiro das madrugadas, hoje acordei liberto. Não liberto do sentimento, mas liberto de mim. Hoje não me castiguei, não me puni. Dormi muito tempo, e consegui acordar. Sem medos, sem remorços, sem nós na garganta.


Acordei conformado, e não senti frio. Senti até uma certa relaxamento. Não tive pressa de me levantar. Abri os olhos e meditei. Desta vez os ponteiros do relógio não rodavam no sentido inverso ao meu. Fiz as pazes com o tempo, e o tempo perdoou-me. Senti-me bem, e deu-me a sensação que os deuses me tinham dado uma segunda oportunidade. Justamente hoje. Renasci.


A ânsia e sufoco permanente de outrora, desapareceram, assim, de um momento para o outro. Deixei de ter medo, e hoje não me vou esconder. Esta noite não me auto-mutilei até ao nascer do sol, não me chicoteei até perder as forças, não me esvaí em sangue, até desmaiar e por fim conseguir adormecer. O cansaço tomou conta de mim, e deu-me repouso. Descansei o corpo e a alma. A serenidade fez uma visita, e prometeu ficar por cá...


segunda-feira, janeiro 10, 2005

Viagem

Arrumo as minhas coisas e parto. Circulo lentamente pela cidade pequena. Uma cidade que cheguei a visitar há muitos anos pelos meses de calor, como turista. Viajo pelas mesmas estradas que percorri na minha infância, e que me lembro, já na altura, tentava decorar a cada instante para não ter problemas no caminho de regresso. Estranhamente, não me causa nostalgia, nem saudade, nem sentimento nenhum. Contemplo descontraidamente a sua arquitectura, os seus edifícios, luzes, cores, e formas. Está deserta áquela hora. Entro na última rotunda, e preparo-me para sair. Não foi por vontade própria que ali regressei. Fui em trabalho, e não pude negá-lo ao patrão embora me apetecesse mandá-lo à merda. Espero não ter de voltar. Dizia sempre que era a última entrega, mas já tinha tido mais que tempo de recrutar um local para me evitar a deslocação.

Circulo já na via rápida que me trará de volta à grande cidade. A cidade onde vivo. Falta pouco para sair da auto-estrada. O mesmo caminho que já fazia nesse tempo, enquanto ansiava pelo regresso. Penso fazer uma viagem calma, a velocidade moderada, porque tenho pouco combustível e este deverá ser à conta para o regresso. Mantenho uma velocidade constante e aproveito inclusivé o balanço das descidas para poupá-lo.

Um carro verde entra numa das vias de aceleração lateral. Embora eu me desvie para a faixa da esquerda abrindo caminho para não interferir com a sua marcha, o condutor não acelera e ao invés, reduz a velocidade, colando-se atrás. Merda! Detesto viajar com carros na rectaguarda. Especialmente quando mantêm uma distância demasiado curta, mas não suficiente para sabermos se querem ultrapassar ou não, ou se vão apenas limitar-se a ficar ali, como uma sombra. Às tantas, dou com o meu pensamento tomado pela presença daquele carro. Não sei se deva manter um ritmo constante, ou se continue a poupar combustível, ou se aumente antes a velocidade e o deixe para trás. A última solução seria sem dúvida a melhor, não fosse a gravidade da escassez de gasolina.

Volto-me a aperceber da presença do condutor. Já não me deixo levar pela irritação, e encaro a situação como uma circunstância inevitável. Resigno-me à ideia. Acabo por criar uma espécie de cumplicidade, e desculpá-lo. Ainda assim prefiriria que ele me ultrapassasse, e vou-me a custo esforçando por não acertar a velocidade em função dele. Permaneço a este ritmo. O condutor ultrapassa finalmente. A personagem intriga-me, mas procuro não imaginar qual será o seu destino. Quero apenas aproveitar o percurso que me levaria ao meu, sem grandes preocupações.

Desta feita fico incomodado por circular com ele minha frente, e por não ganhar velocidade de uma vez por todas, já que tem o caminho livre. Tento ignorá-lo. Pudesse eu, e ultrapassá-lo-ia dissipando-me no seu horizonte... Preciso viajar sem ninguém por perto, para me poder concentrar de novo. Deixo-o ganhar novamente uma distância considerável.

Vejo ao fundo pirilampos azuis iluminando sinistramente a noite escura, e prevejo confusão na estrada... Reparo que o veículo da frente abrandou, lá ao
longe. Três viaturas paradas na berma, e um grande aparato que deixa prever sanções pesadas. Instintivamente sou levado a desviar-me para a esquerda para me afastar daquela confusão toda. Apenas por sorte não fui eu multado, já que era hábito infringir gravosamente a lei naquela recta. Já era altura de ter mais juízo, concluo.

Quando me apercebo que o perigo já tinha passado, dou por mim novamente sozinho na estrada. Sinto-me bem... Recordo a última vez que fiz este caminho. Foi há muitos anos, mas a motivação era a mesma. Deixar a cidade e regressar. O prazer de conduzir sozinho,e aproveitar a viagem para arrumar as ideias. Encaro a viagem como um mal necessário, e tento apreciar a paisagem.

O carro verde ganhou finalmente uma avanço considerável. Ainda bem. Será que fui eu com todas estas preocupações e dilemas, que acabei por lhe causar incómodo a ele? Ás tantas não será mentira nenhuma...

Sem me dar conta, reparo que estou novamente perto dele. Não há dúvidas de que a culpa agora é toda minha. Circulo a 120 km/h, porque me apetecia carregar no acelerador. Podia fazê-lo à vontade, se o ultrapassasse de uma vez por todas. Aqui não dá. Mas não sei se terei paciência para seguir a este ritmo quando deixarmos a via rápida e entrarmos na estrada secundária. Vejo a placa que anuncia o desvio, a 200 metros. De súbito, uma corrente de adrenalina injecta-se-me no sangue, piso o pedal, e preparo-me para ultrapassá-lo nesse instante, antes mesmo da saída.

Não... Desisto a meio da tentativa. Acabei por queimar bastante combustível para lhe ganhar a distância necessária, e depois de subir o ritmo, já não me apetecia abrandar e voltar ao ritmo normal... Além do mais poderia arriscar um acidente, causando-lhe problemas a ele, a mim, e a outros eventuais passageiros. Não havia tanta necessidade de pôr vidas em perigo, ainda mais quando já tinha decidido conduzir nas calmas. Foi sem dúvida a pior das opções.

Chegados ao cruzamento, ligo o pisca. Reparo que o veículo vai seguir em frente, e claro, não tomará o mesmo sentido. Estava prestes a fazer uma ultrapassagem arriscada, sem necessidade nenhuma... Ele continuou pela estrada principal, em direcção ao seu destino. Quanto a mim, sei apenas que tenho mais uns quilómetros de estrada secundária para percorrer, mas desta vez sem stresses...

Finalmente sigo viajando despreocupadamente... Devagar.., contemplando vagarosamente a paisagem... Reparo na imensidão daquele percurso nocturno, e delicio-me novamente com o prazer de conduzir sozinho, calmamente...




Muitas vezes implicamos com outros condutores, só pelo simples facto da sua presença. Depois tentamos ultrapassá-los de forma rápida e desastrada, pelo facto de sermos impacientes, acabando por pôr em perigo tanto nós próprios como terceiros. Vale a pena conduzir com calma e precaução. A bem de evitar
mais mortes neste país: Paz na estrada!

domingo, janeiro 09, 2005

Escrevendo... /X-Ray/

acabo sempre terrível uma voltar lúcido asséptico indiferente distante realidade objectividade mentira sempre madrugada desenrola processo imagem emerge profundo mente projecto insanidade catarses mentais nada mau pensar acto escrita palavras papel sentido continuar sentir descrever forma nada tudo cruzamento linhas fronteira realidade não louco penso vida sentido prazer ...

Escrevendo...

Acabo sempre por voltar aqui, mesmo quando me tento convencer que já passou esta necessidade terrível de voltar a escrever. Uma das razões que me permite voltar, é acreditar que estou curado e que o meu bom senso me deixará parecer lúcido e asséptico. Indiferente e distante, à semelhança da realidade, e da objectividade formal da mesma.

Puramente. Sempre que cai a madrugada desenrola-se o mesmo processo dentro de mim. A imagem emerge avassaladoramente do profundo da minha e não consigo ignorá-la. Projecto sucessivamente toda a minha insanidade em complicadas catarses mentais que vão sempre dar ao papel. Mau não é escrever. É o acto da escrita em mim. As palavras neste papel parecem ter um sentido específico. E continuam a escrever-se...

Vai continuar. Vou continuar assim. É estranho. Seja lá. Não terá que ser necessáriamente mau... Ainda sinto...Não!!! Puro engano. Chega! Queria escrever... Não. vou escrever nada. Não consigo também. Escrevo sobre o nada. O meu nada que tudo...

não ter cruzado as linhas e transpôsto a ténue fronteira da realidade pois não sou louco não escrevo para ser lido porque sonho ainda fazer todo o sentido que não faça escrevo

quinta-feira, janeiro 06, 2005

Dia diferente

Levantei-me tarde, mas acordei rejuvenescido... As muitas horas de sono em claro da madrugada anterior haviam permitido pôr o pensamento em dia. Saí do quarto. Um ambiente tranquilo e adaptado à fútil normalidade das coisas. Respirava-se paz, apesar do frio do inverno. Não há aquecimento central em casa. É muito caro, e provoca constipações, devido ao choque violento de temperaturas. Com demasiados artificialismos na vida moderna, deve-se evitar o excesso de comodismo porque provoca estagnação. Tomei um pequeno-almoço rápido. Depois vesti um agasalho quente e saí à rua. Fui para o trabalho. Há dias assim, aparentemente banais. Cheguei a casa. Não liguei o computador, e descansei um pouco. Na vida temos dias belos. Não há dias iguais.