sexta-feira, julho 31, 2009

The Genius Of The Crowd: Charles Bukowski

quinta-feira, julho 30, 2009

A Leste do Paraíso

Mas eu no fundo precisava disto, e sabia-lo. Estava numa realidade só minha, e dali não saía, só mesmo com a bomba atómica. Eles satisfaziam os seus desejos. Tão simples quanto isso. Sem grandes regras nem protocolos, tudo era regabofe. Eu era como um westrangeiro que acabara de ali chegar, mesmo tendo "vivido" ali durante anos.

quarta-feira, julho 29, 2009

Futilidades

Tudo parecia um pesadelo, um longo pesadelo que teimava em terminar, em desaparecer para sempre no esquecimento. A podridão exalava um cheiro insuportável dos corpos caídos que agora se arrastavam pelo chão como serpentes de sangue frio mortas que teimavam em exibir orgulho decadente confundido com uma miséria atroz que se parecia resumir a um orgasmo fingido pelos golpes profundos que outrora os haviam desfigurado, e os sonhos que persistentemente tentavam esquecer por já terem há muito desistido, apenas julgando alcançarem a vida nos precisos golpes em que desferiam morte e sofrimento

Ela parecia simplesmente uma cópia de má qualidade daquilo que poderia ter sido, reduzida a uma criança desesperada tentando imitar uma porn-star que um dia lhe pudesse imaginar ter tido aos olhos de terceiros a glória que sempre se sentiu incapaz de alcançar, rodeada de crianças mal amadas posando etéreamente na imitação dos seus heróis mortos, mas fugindo como o diabo da cruz de todo o drama interior que sempre tentavam ocultar.

Do meio de todo aquele sangue conseguira salvar o que restava, tentando recolher todas as peças esquecidas no passado, e que agora me permitiam voltar a ser eu. Como podia ter chegado ao ponto de depositar naquele desespero todas as minhas forças e esperanças, denegando a todo o tempo o óbvio, a futilidade dissolvida em álcool mas que não conseguia nunca fazer esquecer aquele sabor acre da eterna adolescência à minha volta que havia confundido com maturidade?

Num imenso buraco negro depositava agora toda a dor, todas as memórias recentes. Os profundos golpes das facadas saravam em mim rápidamente, apenas as caras escondidas por entre a escuridão da noite tentavam reaparecer desesperadamente por entre o sangue, escondendo as facas por entre os pesadelos que noite após noite os atormentavam, como se fosse aquilo a sua última motivação...

Salvava-se apenas a esperança, que reaparecia ao longe, cansada, saída do passado remoto, mascarada por uma tentativa desesperada de ocultar a triste realidade do presente que teimava apenas em querer salvar pelo orgulho. Eliminado para sempre o último ano ensombrado pelas futilidades crónicas e desesperadas dos que profundamente nunca mais quereria relembrar, o passado mais distante fazia-me sentir irremediavelmente culpado por todos os erros incorrigíveis das minhas desastradas (in)decisões. Eliminado o presente recente, desprezado pelo passado distante que teimava em reviver, aguardava, sem poder fugir do meio da podridão, as faces incógnitas de um futuro utópico, desnudado de todas as farsas e futilidades desta sociedade corroída pela hipocrisia, desespero e inveja.

Aqueles a quem tinha ouvido gastarem a voz, fazendo confundir as palavras paz, amor, liberdade, igualdade e fraternidade eram a imagem de tudo com que de pior esta sociedade de merda tinha transformado aquilo que não passavam de panfletos egocêntrico-egoístas-umbiguistas burlescos, vazios de matéria e conteúdo. Aquilo que outrora neles pareciam ser representações de sentimentos não passavam no fundo de efémeras futilidades intriguistas encenadas até à exaustão.

Queria apenas esquecer tudo, remeter as imagens para o buraco negro.
Acordado desse pesadelo, sobrava renascido apenas eu, com a sede de quem tinha estado um ano morto.

Se ao menos pudesse recuperar aquele passado distante que verdadeiramente tinha valido a pena, mas que só agora conseguia começar a compreender...

Apenas a luz ainda parecia brilhar em mim nas noites de escuridão, sem saber sequer se seria apenas mais um mero efeito vazio de ilusão óptica como tantos outros...

terça-feira, julho 28, 2009

O Carro da Lama

A relação com a psicótica tinha sido um pesadelo, um filme de horror de má qualidade, com litros e litros de sangue e membros estropiados... Eu, depois das facadas, parecia agora um cadáver mutilado, uma monte de destroços, um zombie moribundo arrastando o seu cadáver decaindo de dia para dia. Não tinha casa, era como um sem-abrigo, sem sítio onde cair morto, a tentar recuperar. Tinha sido o alvo fácil do escárnio e das farpas de todos os seres miseráveis que encontravam na minha tragédia fulminante um motivo forte para se poderem sentir melhor na sua própria miséria, e por muito desesperante que lhes parecessem as suas situações, a minha seria de longe a pior que já tinham visto. Tinha perdido o pouco do ser que era e aos olhos de todos eles valia menos que zero, valia pelas gargalhadas gerais que suscitava a minha presença vazia. Certo é que eles para mim valiam agora muito menos do que esse menos zero, enquanto eu ia crescendo de dia para dia, à medida que o passado mais distante me voltava à superfície...

O meu ódio por ela era como um imenso oceano que não parava de crescer avassaladoramente de segundo para segundo. Não havia limites para esse sentimento corrosivo. Nunca tinha imaginado conseguir odiar ninguém com tanta força. Embora não me passasse pela cabeça muitas vezes a imagem daquela podridão humana, o meu mais profundo desejo era o seu sofrimento, saber que algo ou alguém (que não eu) lhe causasse uma dor infinita nunca antes sentida por nenhum ser vivo. Agora compreendia os sentimentos de vingança com requintes de loucura e malvadez. Tal como na metáfora de Miller, o meu desejo era que ela fosse um peixe daqueles que implodem e rebentam por dentro quando sobem demasiado, acima da pressão para a qual o seu organismo está preparado. Que todo aquele leite a intoxicasse, que toda a esporra deste mundo a inundasse até ela morrer afogada em sémen e desaparecesse imersa para todo o sempre. Ela que se julgava uma deusa, era como a puta mais decadente, uma amostra barata e de má qualidade de uma espécie de atriz porno que eu desejava sádicamente ver cair em desgraça. Borderline, psicótica, sado-masoquista, psicopata. Compreendia agora porque ninguém nunca a tinha aceite senão para foder para o pagamento da droga. Não fosse o rol de mentiras, conhecendo-a eu como a conheço hoje, acho que nem uma foda daria naquele monte de DSTs andante, tal como ninguém que a conhecia a desejava para mais do que despejar colhões e roda-la na mesa como uma boneca insulflável chinesa de uma sex shop rafeira.

Ela era para mim como o carro da lama, um carro que servia para carregar a merda de todos os estábulos e pocilgas da cidade, que num inverno rigoroso e interminável se ia arrastando lentamente atolado, chafurdando fundo no meio da lama, puxado por uma junta de bois velhos e gastos imersos até à cabeça, ameaçando desfalecer a qualquer instante. Ela era o escarratório público da cidade, onde todos iam evacuar a merda quando a necesidade física apertava. A sua cona era como um imenso esgoto onde todos os canos de merda do mundo iam desaguar. Todo o meu sentimento em relação aquela coisa se reduzia a um imenso nojo, um asco típico de alguém que cai na fossa séptica mundial quando esta entope e fica a transbordar merda ininterruptamente por não ter escoamento.


Contudo eu estava a recuperar lentamente. Bastava-me sair de casa para atrair um ou outro olhar feminino. Mas faltava-me a força para fazer o que quer que fosse. Em todas as mulheres via a perversidade dela. Era uma questao de tempo até esquecê-la, e agora era preciso atravessar um longo deserto até conseguir voltar a amar a sério uma mulher..

E no entanto retirava um certo prazer masoquista desta situação. A vida até então parecera-me demasiado fácil. Estava perante o maior desafio da minha vida, e tinha-me voltado a inspiração para pensar e para escrever. A solidão trazia-me de volta ao verdadeiro eu. E tinha aprendido a seleccionar melhor as pessoas a quem me queria dar.

sábado, julho 11, 2009

Canibais

Tentava-me mexer, mas já não adiantava, o meu corpo deixara de existir. Eles tinham-me espancado, e eu tinha esquecido a vida, o prazer, a felicidade. Podiam-me ter tirado daquele buraco, podiam-me ter puxado um braço, atirado uma bóia, enquanto eu ainda mexia, mas não, foi precisamente o contrário, era no mais fundo possível que eles me queriam deixar, era no sofrimento mais lento, mais doloroso que consistia a tortura. Poucos se negavam a executar a sentença, até ao último momento, para que o sadismo fosse maior. No final, lá se ia sabendo qualquer coisa mas muito lentamente, não , era uma tortura lenta e dolorosa...

Enquanto o sangue se esvaía pela mais pequena veia, enquanto o veneno fazia o seu efeito, enquanto queimavam o ano inteiro, com o cuidado de não deixar marcas para que o corpo pudesse ir recuperando, eles riam e copulavam em alvoroço, os maquiavélicos detalhes do macabro plano.

Esperavam «, enquanto davam pontapés, murros, batiam com paus, ferros, arrancavam bocados de  com os dentes, e eu preso. Olhavam para puta declarada que ria em gargalhadas histéricas, sempre no divã, copulando a todo o tempo, no meio de um círculo, enquanto ia dando ordens a todos à sua volta. Apesar de todo o aparato, a sua cona era a sua arma. Com ela tinha conquistado todo aquele território, toda aquela área, eeles veneravam-na. Tinham deixado as todas desgraçadas, e muitos lambiam o seu leite, para que pudesse amamentar o próximo. Assim passavam os dias. Contudo até isto era para eles aborrecido. Então ela declara que se teriam que inventar novas discussões, que aquilo não era suficiente, e lá saía mais merda. Era necessário dar novos requintes de estupidez à coisa, uma vez que segundo ela a humanidade estava atrasada nesta merda. Cabia-lhe a ela criar uma nova coisa, anunciou publicamente o seu plano aos sete ventos. Todos já sabiam menos eu, contudo era o seu destino. Ela queria ser a pior à face da terra, e mesmo no fim do mundo, queria que o seu nome fosse conhecido e que fosse lembrada como a mais puta. Estava determinada a provar que o diabo seria ela, que seria ela o novo satã, feminino, decidida a provar que conseguia descer até ao fim.

Seria comido vivo pelos outros, pensava eu, seria a pior coisa que podia acontecer. Mas não. Eles enquanto me assavam, iam atirando lenha para a fogueira, embora de forma a que o calor não fosse suficiente para me queimar muito. Pelo contrário mantiveram-me unstempos, queriam que sobrevivesse para que, à media que me iam mordendo mastigassem e cuspissem fora, sentirem o sabor do veneno que os fazia chegarem ao êxtase. Não resultou. Eu caguei e fui à minha vida. A droga fazia o efeito de me retirar energia, porque era demasiado forte, mas depois de entranhada, me olhava a fazer troça.

Durante todo este tempo ela dizia que era para o meu bem, que eu não tinha amigos que me viessem resgatar, mas eu não compreendia, achava que sim, estava profundamente convencido disso. Mas que eu saiba não apareceu ninguém, embora vários tenham dito que se tinham cá dirigido com essa desculpa. De seguida copulavam. Bela merda toda este enredo e tristes figuras de personagens.

Ela tratou de falar com eles , sem deixar nenhum que pudesse denunciar. Tratou que deixassem de existir, com a notícia de que eu não estava. Com as ex-namoradas foi igual, remendo que alguém um dia se pudesse voltar a lembrar, tratando de apagar-me. Esta pessoa odiava-me, queria-me eliminar e dar um exemplo ao mundo, e ninguém me tinha avisado desta doença, o ódio. Era um assassina de carácter, com toda a violência psicológica a isso inerente, e todos os sádicos aplaudiam e atiravam terra. Tinha-me escolhido a mim, e tratado com os deuses imaginários dela que não haveria sacrifício igual. Todos observavam aquele triste espectáculo.
Talvez eu seja mesmo um zombie, talvez seja mesmo um extra-terreste, talvez seja um bocado diferente destas novas modas. Tenho outros valores, outros sonhos. Nunca gostei de torturar animais, apenas lhes dava festas. Nunca pratiquei bullyng na escola, nunca bati nos mais fracos, nunca matei nem quis matar, nunca consegui tirar prazer do sofrimento dos outros. Como é possível haverem pessoas tão más, prevendo tudo desde o inicio, toda a dor infligida, deliberadamente transformar-se em cannibais. Que prazer se pode tirar da agonia do ódio? Para eles, a tortura e a dor parecia para eles o essencial.


É isto o "ser humano"?

Como se tornam as pessoas em canibais?

Porque retiram mais prazer do sofrimento dos outros do que do seu próprio prazer?

Deitaram ainda mais lenha para a fogueira.

Todo o bem que lhes fiz só serviu para encher ainda mais os seus egos egoístas, que viraram para mim um sorriso maléfico de prazer... Todo o meu amor pela falsidade sai agora do meu corpo em forma de pus, de cicatrizes. Tudo o que era e que fui, todos os valores, tudo jorra para fora de mim e completamente até ser o nada... O amor, a vida, a ingenuidade, a felicidade, tinha apodrecido , ficava esquecido na outra vida.

Depois riam-se, andavam juntos, e voltavam para mais..

A única coisa que lhes parecia dar prazer, para além do ritual do círculo, era a minha tortura, onde todos se procuravam destacar, de forma a provocar uma benesse, que volta e meia lá ia tomando providências , para que o sacrifício fosse  o maior (cujo suprassumo ela reivindicava ser).

A tortura mais lenta e dolorosa. Os psicopatas.

No primeiro dia afirmou: tenho larga experiência em rituais. Era mentira, era a mais verde. Desde aí  o vazio. Mas isso aborrece-me, preciso de infligir novos limites...

De inteligência, sanidade, e uma certa higiene mental.

O Sonho


O sonho, que agora percebia ser um sonho, era um pesadelo multiplicado ao infinito, estava morto, e não sabia.. mas ninguém tinha dado a notícia ao corpo potrefacto. Mas não um pesadelo qualquer, senão o pior, e o pior é que por mais que me mexesse, que me beliscasse, que fechasse e abrisse os olhos, não conseguia acordar. Estava mergulhado num pesadelo, que não consiga esquecer nem ignorar. Um zombie, num vegetal sem força ou vontade de vingar nos vivos. Já não conseguia dormir nem sonhar. Todos eram cúmplices, e festejavam, cartazes, desenhos, textos, diálogos o que fosse arte, multiplicavam as ondas de repercursão ao infinito. Eram eles, e no final estava eu.


Elsa era para mim neste momento um monstro, que não tinha conhecido um segundo de empatia ou consideração por mim. e por todo o mal que me fazia, sem se importar com o sofrimento, daí retirava o seu prazer extra. Era a Mentira infinita. Por debaixo da máscara era uma pessoa fria, frustrada, infeliz, calculista, ocultando uma personagem falsa e estéril, sádica, incapaz de mostrar um pouco de verdade ou amor em si. Tudo era representação. Tinha passado um ano inteiro com uma psicopata, com uma assassína, e não havia suspeitado de nada. Ela dizia que eu é que era paranóico. Pelas minhas contas Elsa devia ter milhares de vezes sem eu suspeitar de nada. Os seus amantes eram ... Desde os regulares (semanais que iam picando o ponto dia sim, dia sim), que deviam ultrapassar o n infinito... até aos esporádicos, aos ocasionais, a todos... Elsa nunca dizia que não a uma, quer fosse o amigo do namorado todos, quer fosse o velho de taska mais asqueroso (bastava pagarem-lhe um bagaço.) Ela própria, de uma forma eufemística, dizia que se sentia vazia, por dentro, que não me poderia contar os podres da vida dela, que era como um um sentimento capitalista de consumo, e que precisava de me chupar o sangue todo porque segundo ela, era eu que lhe dava a força e auto-estimas necessárias para poder continuar. Mas que lá combatia esse vazio preenchendo-se com o maior número possíveis T e o seu ideal seria estar sempre o dia todo, fosse lá, eles iam-se rendendo e ela geria tudo matemáticamente como uma secretária registadora. Dizia ser a mãe de todos os homens, prostituia-se pela cidade e até Já nada disso importa agora, são meros pormenores...


O que mais me impressionava era que durante um ano inteiro tinha vivido uma mentira, não somente. Todos os seus sorrisos, todas as suas gargalhadas, todos os seus olhares, todas as suas frases tinham sido uma mentira, uma falsidade, uma representação, uma hipocrisia desde o primeiro momento repetida até à exaustão, em frente de todos aqueles que alinhavam pela mesma batuta: mentira e hipocrisia. Em todos eles, tudo era falsidade.
Durante um ano inteiro eu tinha sido o maior *?3#»+/*"@ de toda a cidade. Bastava-me ir aos cafés ou aos locais de diversão nocturnos para ser destacado em voz alta e de dedo em riste, para ser alvo da troça geral daqueles que precisam de gozar e chamar nomes aos outros para se sentirem um pouco melhores na sua própria miséria. Sentia-me como um morto a apodrecer numa prisão, condenado à morte sem saber ainda a data da execução.


Mas neste pesadelo era ela que eu odiava acima de tudo, não fosse ódio um sentimento próximo do amor e eu tela-ia odiado com nunca antes alguém tinha odiado outra pessoa. Mas o ódio era um sentimento demasiado humano. Seria apenas um nojo infinito, numa náusea eterna. O problema é que não era só ela. Eram também todos os que tinham representado, que tinham fingido, e acima de tudo ficavam mal nas fotografias. Mas em última análise o culpado era eu, por não me ter ouvido, por me ter deixado levar como uma criança. O mundo era feio tenebroso, a humanidade não valia nada, era simples vómito de sémen que alguém engolia, escória desfeita pelos intestinos e expelida pelo cú. Estava condenado ao isolamento. Não tinha amigos, ninguém... Todos se riam, mesmo depois de ela ter partido. Todo eu era miséria, dor, tristeza... A única voz que ouvia era eu a falar comigo próprio. A única que me interessava.


Sentia-me podre, morto, dorido. Era como um zombie, sabia que a partir daquele momento jamais poderia confiar. E um zombie sem forças, incapaz de se tornar vampiro, incapaz de perpetuar o ritual sádico da mordidela no pescoço. O meu corpo arrefecia. Não conseguia esquecer que todos aqueles anos erma para o lixo. Todo esse submundo onde as palavras ganham outro sentido, onde o único valor é passar por cima, repugnava-me Aqueles que pensava prestarem tinham sido aqueles que mais prazer tiravam da miséria, por essa ordem proporcional. Sabia que nunca poderia, jamais, ser eu. Teria de guardar tudo para mim próprio. Quanto menos falasse doravante, melhor...


Noutras circunstancia teria ficado feliz por me ter visto livre dela, uma ela semelhante a todas as cobras assassinas que agora conseguia visualisar. Tinha descoberto a natureza humana, a natureza da humanidade, e tudo mudava de perspectiva. A própria voz me dava asco. Ninguém dizia nada sem um segundo sentido, e esse segundo sentido era simplesmente isso: foder, foder, foder, e nos intervalos retirar prazer do sofrimento dos outros. Neste mundo, uma pessoa valia em igual razão ao número de amantes, de hipocrisia, de promiscuidade que era capaz de executar, e do grau de sadismo que pudesse imputar às vítimas.
Até aí ela dizia-me que o problema era eu, que precisava de aprender a, a tirar o fechar os olhos, a tirar o sentido sexual de todas as coisas, e a tentar esquecer que o resto do mundo existia. Ela dizia que era simples, que lhe repugnava o sexo e a traição, que eu não me preocupasse com nada. Trágicamente era esse o seu maior e único objectivo, mas a realidade era o seu oposto.
Agora, o mundo desabava sobre mim. Todas me procuravam para mandar a estucada final, para ver até que ponto do meu sofrimento podiam tirar um prazer sádico, que era o possível. 

Eu, mergulhado numa metamorfose kafkiana, e tudo à minha volta era merda.


Ao ler os blogues, uma sensação de desespero tomava conta de mim. Pela primeira vez senti uma verdadeira crise: a ideia de culpabilidade, a ideia de desespero, a ideia de vazio, de ruína, de nihilismo total e absoluto. Já nem o sexo que todos veneravam eu conseguia ver com entusiasmo. Já nem a simples amizade, onde eu pensava viver emergido, fazia qualquer sentido. Era o nada absoluto, o zero último, e eu estava no centro dele. Todo o passado havia sumido, nem uma memóri restava. Tudo havia sido queimado ou destruído até ao último resquício.


Sabia que tinha sido estúpido, burro, cego por não querer ousar pensar. Todas as paranóias, todos os sonhos tinham sido o meu subconsciente a alertar-me, e eu tinha ignorado. Todas as crises tinham sentido, a paranóia era simplesmente o facto da intuição querer avisar. Durante todo o tempo eu não conseguia perceber porque razão não me conseguia desprender, não me conseguia soltar e amá-la com todas as forças, sem medo. Havia uma ânsia permanente dentro de mim que me prendia, a dizer que eu não podia confiar, e eu tinha-me ignorado. Sabia que algo não estava bem, que aquilo não fazia sentido desde o primeiro minuto, só não sabia porquê. Não há como lutar contra o inconsciente.


Agora é o nada. O vazio absoluto. O zero. A dor infinita. O sofriento. A penúria, o exílio. Vagueio como um doente em convalescênça e nem o nada que antes me dava prazer me entusiasma. As pessoas falam comigo mas tratam-me como um fantasma. Sou um zombie à deriva, sem pretensões nem forças de me tornar vampiro e ascender à mentecaptilidade. É a náusea absoluta... Nojo...



Jamais,
jamais seria capaz de voltar a olhar,
jamais seria capaz de acreditar,
jamais seria capaz de ver,
jamais seria capaz de sentir,
jamais seria incapaz de aguentar mais daquela merda, fosse como fosse.
Nada.
Jamais.

Percebia agora que não estava louco.

Estava simplesmente um sonho...

A apodrecer no imediato despertar.


Não havia nenhuma luz, nem sequer nenhuma sombra.

Levantei-me e abri  a janela. 

Já não havia psicopatas...