Escrever um nome no fundo da caixinha de recordações. De seguida escondê-la, na prateleira mais alta, e apagar todos os outros vestígios... Reaprender a viver sozinho. Fazer as pazes comigo próprio.
domingo, fevereiro 27, 2005
Escrever um nome no fundo da caixinha de recordações. De seguida escondê-la, na prateleira mais alta, e apagar todos os outros vestígios... Reaprender a viver sozinho. Fazer as pazes comigo próprio.
Cartas de Amor - Fernando Pessoa
Agradeço a sua carta. Ella trouxe-me pena e allivio ao mesmo tempo. Pena, porque estas cousas fazem sempre pena; allivio, porque, na verdade, a unica solução é essa - o não prolongarmos mais uma situação que não tem já a justificação do amor, nem de uma parte nem de outra. Da minha, ao menos, fica uma estima profunda, uma amisade inalteravel. Não me nega a Ophelinha outro tanto, não é verdade?
Nem a Ophelinha, nem eu, temos culpa nisto. Só o Destino terá culpa, se o Destino fosse gente, a quem culpas se attribuissem.
O Tempo, que envelhece as faces e os cabellos, envelhece tambem, mas mais depressa ainda, as affeições violentas. A maioria da gente, porque é estupida, consegue não dar por isso, e julga que ainda ama porque contrahiu o habito de se sentir a amar. Se assim não fosse, naão havia gente feliz no mundo. As creaturas superiores, porém, são privadas da possibilidade d'essa illusão, porque nem podem crer que o amor dure, nem, quando o sentem acabado, se enganam tomando por elle a estima, ou a gratidão, que elle deixou.
Estas cousas fazem soffrer, mas o soffrimento passa. Se a vida, que é tudo, passa por fim, como não hão de passar o amor e a dor, e todas as mais cousas, que não são mais que partes da vida?
Na sua carta é injusta para commigo, mas comprehendo e desculpo; decerto a escreveu com irritação, talvez mesmo com magua, mas a maioria da gente - homens ou mulheres - escreveria, no seu caso, num tom ainda mais acerbo, e em termos ainda mais injustos. Mas a Ophelinha tem um feitio optimo, e mesmo a sua irritação não consegue ter maldade. Quando casar, se não tiver a felicidade que merece, por certo que não será sua a culpa.
Quanto a mim...
O amor passou. Mas conservo-lhe uma affeição inalteravel, e não esquecerei nunca - nunca, creia - nem a sua figurinha engraçada e os seus modos de pequeneina, nem a sua ternura, a sua dedicação, a sua indole amoravel. Pode ser que me engane, e que estas qualidades, que lhe attribúo, fossem uma illusão minha; mas nem creio que fossem, nem, a terem sido, seria desprimor para mim que lh'as attribuisse.
Não sei o que quer que lhe devolva - cartas ou que mais. Eu preferia não lhe devolver nada, e conservar as suas cartinhas como memoria viva de uma passado morto, como todos os passados; como alguma cousa de commovedor numa vida, como a minha, em que o progresso nos annos é par do progresso na infelicidade e na desillusão.
Peço que não faça como a gente vulgar, que é sempre reles; que não me volte a cara quando passe por si, nem tenha de mim uma recordação em que entre o rancor. Fiquemos, um perante o outro, como dois conhecidos desde a infancia, que se amaram um pouco quando meninos, e, embora na vida adulta sigam outras affeições e outros caminhos, conservam sempre, num escaninho da alma, a memoria profunda do seu amor antigo e inutil
Que isto de "outras affeiçõpes" e de "outros caminhos" é consigo, Ophelinha, e não commigo. O meu destino pertence a outra Lei, de cuja existencia a Ophelinha nem sabe, e está subordinado cada vez mais á obediência a Mestres que não permittem nem perdoam.
Não é necessario que comprehenda isto. Basta que me conserve com carinho na sua lembrança, como eu, inalteravelmente, a conservarei na minha.
Fernando
29/XI/1920
sábado, fevereiro 26, 2005
Cartas de Amor - Fernando Pessoa
Ophelinha:
Para me mostrar o seu desprezo, ou pelo menos, a sua indifferença real, não era preciso o disfarce transparente de um discurso tão comprido, nem da serie de "razões" tão pouco sinceras como convincentes, que me escreveu. Bastava dizer-m'o. Assim, entendo da mesma maneira, mas dõe-me mais.
Se prefere a mim o rapaz que namora, e de quem naturalmente gosta muito, como lhe posso eu levar isso a mal? A Ophelinha pode preferir quem quizer: não tem obrigação - creio eu - de amar-me, nem, realmente necessidade (a não ser que queira divertir-se) de fingir que me ama.
Quem ama verdadeiramente não escreve cartas que parecem requerimentos de advogado. O amor não estuda tanto as cousas, nem trata os outros como réus que é preciso "entalar".
Porque não é franca para commigo? Que empenho tem em fazer soffrer quem não lhe fez mal - nem a si, nem a ninguém -, a quem tem por peso e dor bastante a propria vida isolada e triste, e não precisa de que lh'a venham accrescentar creando-lhe esperanças falsas, mostrando-lhe affeições fingidas, e isto sem que se perceba com que interesse, mesmo de divertimento, ou com que proveito, mesmo de troça.
Reconheço que tudo isto é comico, e que a parte mais comica d'isto tudo sou eu.
Eu-proprio acharia graça, se não a amasse tanto, e se tivesse tempo para pensar em outra cousa que não fosse no soffrimento que tem prazer em causar-me sem que eu, a não ser por amál-a, o tenha merecido, e creio bem qeu amál-a não é razão bastante para o merecer. Enfim...
Ahi fica o "documento escripto" que me pede. Reconhece a minha assignatura o tabellião Eugenio Silva.
1.3.1920.
Fernando Pessoa
pp. 48-49
What am I doing II ?
What am I doing?
Fodasse... Será que o meu super-ego há-de sempre ganhar esta merda?? Puta que o pariu... a sociedade que vá reprimir o raio que a parta..! Na minha vida mando eu, caralho!
Isto para dizer que na minha verdadeira opinião, precisáva mesmo de ter uma conversa com ela. Acho que se não falarmos, isto nunca vai ficar completamente resolvido. As últimas respostas surgiriam todas lá.
Eu faria as despesas da abordagem, e introduziria as ideias em metáforas de conversa banal.
Mas para isso ela teria que aparecer, e dar a entender que estava preparada para enfrentá-lo...
É que eu não faço a mínima ideia do que vai na cabeça dela. Não sei realmente o que pensa ela sobre tudo isto, e qual seria o desfecho que escolheria. Não sou eu que vou pensar por ela. Tem mais do que capacidade para isso... É ela quem tem de escolher o seu próprio destino.
E que vença a timidez,
e o dê a entender depois.
Se quiser...
E há sonhos lindos... Mas não consigo nunca associar esses cenários surreais dos sonhos a qualquer realidade que conheça. É um exercício perigoso para o qual não existe comparação. Penso mesmo que não te devia ter escrito estes rabiscos. Nunca aceitei o facto de ter perdido o controlo assim, conscientemente, ao longo do processo... Por isso fiquei com um peso na memória, até ontem... Mas recuperei-me. E tu.., tu tens um mundo de possibilidades infinitas à tua escolha. Tantos e tantos sonhos, tantas e tantas mais noites para sonhar... Liberta o teu subconsciente, e descansa. Não contes nada a ninguém. E se algum dia tiveres a sensação que acabas de ter o sonho mais lindo da tua vida, não te deixes acordar... E não precisas dizer nada, porque nesse dia as pessoas olharão para ti, e compreenderão que estás a sonhá-lo naquele preciso momento.
everia ter acordado. Tu não mereces ter ter a tua vida entalada neste problema sem fim à vista. Isto destrói-nos. Enche-te de força. Vai ser feliz! É por gostar tanto de ti, que te digo isto... Conheço-te relativamente bem, e sei que mereces. És pura, genuína. Só precisas de te libertar dos teus próprios preconceitos. Faz isso por ti.., por mim, por nós...
sexta-feira, fevereiro 25, 2005
Ela de facto conhecia-o demasiado bem, ao ponto de conseguir imaginar que ele iria perder o controlo e tentar contactá-la...
Ele conhecia-la demasiado bem para saber que aquilo não era fruto do acaso, que se tinha desligado propositadamente.
Durante dias, deixou-se arrastar para um estado permanente de ânsia e loucura.
O seu instinto desesperado tomava conta do seu corpo à deriva,
perdido enquanto calcorreava decadentemente as ruas
até por fim desistir e dar por si num beco sem saída.
No dia em que os acasos se cruzaram para desafiar as leis da física,
e que uma simples conversa hipócrita e normal
teria feito um desvio de 180º na previsibilidade das coisas,
entregou-se a loucura à outra parte,
e fugiu-se para não se ser julgado.
Fingir-se não seria mais fácil?
Seriam assim tão maus actores?
Não arriscavam nem um improviso
num papel mais que ensaiado?
Faltou tão pouco....A inibição deles foram as cartas.
As mesmas que os conseguiram salvar no último suspiro,
obrigavam-nos agora a esconderem-se um do outro.
Queimem-se essas cartas, para que se possam finalmente revelar um ao outro!
Tudo o que quereriam escrever, passassem agora a guardar.
E um dia, quebre-se o muro, e festeje-se infinitamente a liberdade...
Ela é calma, pragmática e calculista. Ele é nervoso, idealista e impulsivo.
Ele não consegue nem procura esquecer. Ela tem medo do que possa acontecer.
As faces opostas que anseiam o preciso meio termo queas faria fundir,
vidas que são como puzzles inacabados, onde faltam peças fundamentais
que não se sabe se algum dia se irão descobrir..
Continua fazer de conta que tudo isto irá mesmo acontecer.
Talvez seja mesmo doente. Talvez um dia alguém o consiga tratar.
Até lá esconde-se num silêncio estratégico e cobarde
até que possa surgir surgir naturalmente nesse dia...
Que talvez surja amanhã.
Que talvez não chegue nunca.
Vitória não será chegar.
Sentia-se bem por não se ter deixado partir.
quarta-feira, fevereiro 23, 2005
Mão Morta
AMESTERDÃO
have big fun
[Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro]
Amsterdam. Have big fun. Have big fun. Have big fun.
Entrei no Amstel a toda a velocidade e quase abalroei um barco-táxi que ia a passar. O piloto ficou a mandar vir de punho erguido, mas eu continuei no máximo de aceleração Amstel abaixo. Adoro sentir o vento frio na cara.
Junto ao Munt Plein acostei e fui dar uma olhada ao catálogo do Big Fun. Tinham Black Bombaim. Comprei 2 pacotes e enrolei um joint a acompanhar o café. Depois meti-me no barco e rumei à Red Light. Apetecia-me sexo ao vivo. Pelas ruas que ladeiam o canal, a multidão, vagarosa, espreitava as raparigas nas montras. Acostei frente ao Jimmy's ouvindo o jazz melancólico que vinha da cave, e entrei no Barbie. Estava quase vazio. No palco-aquário um casal iniciava um número de sexo. O homem, de mãos atadas, tinha uma corda à volta do pescoço, que a mulher ia apertando com o crescendo da excitação - morreu enforcado no momento do orgasmo. Gostei da representação. Enrolei outro joint e saí. Cá fora a multidão continuava a sua passeata mironante e quase fui atropelado por um ciclista. Meti-me no barco e regressei a casa. A toda a velocidade.
Have big fun. Have big fun. Have big fun. Have big fun.
Countdown
-No I´m just thinking... I keep no one else, just my memories...
-Come on then, you have to start preaparing your stuff. The train will leave soon.
Are you sure you still want to buy the ticket? No one ever returned..
-Yes, there's nothing for me here, left. I'll just stay here a few minutes longer, and then I´ll go...
Não acredito em bruxas. Mas lá que as há, há...
Não se explicam coincidências com fenómenos metafísicos, por mais improváveis, estranhas, absurdas e ilógicas que estas por vezes possam parecer...
Nem maldição, nem feitiço, nem destino... É simplesmente obra do acaso. Explicável ciêntificamente pela física. Apenas um conjunto de equações matemáticas a que chamam lei das probabilidades.
terça-feira, fevereiro 22, 2005
segunda-feira, fevereiro 21, 2005
My Dying Bride
I know no shame
The empire of my desire
Gathers you into my fire
I hope you fall. Hope you call,
My filthy name. It makes you crawl
On you knees, with all your pleas.
Lay down there, look up at me.
Are you alive my dear,and breathing?
Are you diseased my dear,and bleeding?
I'll lift you high my dear,
I'll have you dreaming.
'Tis time to say farewell, to your pleading.
Poor devils as thou art. A ruin at my feet.
Go drop your little life, and welcome up my sleep.
So briefly at my side. So simple in defeat.
No more lies utter from you.
From mine eyes I must take you.
No longer wise. Nothing is new.
Tears for my trembling faith.
You shall not die unsung.
Goodbye my dear, you wicked thing.
I have no tears, beautiful thing.
No silver pail to catch them in.
So ends this tale you did not win.
Tenho uma doença grave. Uma ferida cá dentro. Não uma ferida superficial, daquelas surgem e desaparecem ao fim de algum tempo. É uma espécie de hemorragia interna. Uma espécie de doença crónica, permanente. Uma ferida que arde. Um ardor que não vê, que não se revela, que não se deixa detectar por nenhum exame médico. Uma dor aguda, que reaparece constantemente. Sinto-a dentro de mim. De cada vez que me mexo, de cada vez que respiro, de cada vez que falo… Dói-me. Sempre que me debruço, sempre que me vergo, sempre que me deito virado para o lado esquerdo, sempre que acordo com o ombro adormecido… Tem origem no peito, no tórax. Sinto-a depois percorrer todo corpo, como um arrepio de calor, como um formigueiro paralisante. Uma sensação amarga. O organismo, tenta a custo minorar os estragos. As descargas eléctricas vão assegurando a libertação das endomorfinas, de forma a assegurar o equilíbrio possível entre as intermitentes dores lancinantes com extasiantes sensações de prazer momentâneas. Médicamento inútil, que não trata, só adia... O médico mente. Diz que não tenho nada. Não parece conseguir diagnosticá-lo. Não parece querer tratá-lo. Limita-se a dizer que não há nada a fazer…
domingo, fevereiro 20, 2005
Presumo que para não represente absolutamente nada. Que se esteja nas tintas para o que o que sinto e fui deixando escapar por linhas travessas. Mas custava muito dizer isso na cara, indirectamente? Custava muito olhar uma última vez, durante breves minutos, para se poder partir em paz? Entendo perfeitamente que não sente, a partir do momento em que toma tal decisão. Caso contrário teria coragem para ousar desafiar o destino. Caso contrário teria a força de vontade necessária para fintar a força das convenções sociais da (a)normalidade, e compartilhar um fantástico momento de magia, por mais breve e formal que ele fosse... Talvez se tomasse verdadeira consciência da efemeridade da vida.. Talvez se o sentisse...
sábado, fevereiro 19, 2005
sexta-feira, fevereiro 18, 2005
Por esta hora da madrugada, já não se vê ninguém Percorro lentamente, com os livros debaixo do braço, o caminho que me trará de volta a casa. A noite que era para ser caseira, depois musical, depois de copos e cigarros, acabou no final por ser uma noite de estudo. Já não aguentava mais estar fechado em casa. Mas toda esta agitação frenética da noite, também já me dá náuseas. Isolei-me numa biblioteca, e finalmente consegui-me concentrar.
quinta-feira, fevereiro 17, 2005
Estranha Sensação
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a fumar sôfregamente
mesmo quando sinto já os pulmões cancerosamente a arder
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a dançar frenéticamente
mesmo quando sinto que já nem forças tenho para caminhar
Que estranha sensação esta
que me a leva a continuar a abrir a boca e falar
mesmo quando sei que nem eu próprio me suporto mais ouvir
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a escrever com esta caneta sem tinta
mesmo quando sei que nunca ninguém vai compreender nada quando ler
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a ouvir esta música deprimente
mesmo quando sei que sou eu próprio que me condiciono propositadamente
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a sonhar inconscientemente
mesmo quando sei que ao longe vão parecer apenas dias e não madrugadas
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a perseguir um final idílico
mesmo quando sei que o início desta história nunca foi sequer reconhecido
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a ir esperar ao terminal diáriamente
mesmo quando sei que nesta estação abandonada já não passam comboios
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a acreditar em pista falaciosas
mesmo quando sei que são apenas folhas que o tempo quis levar e que o medo tentou depois queimar
Que estranha sensação esta
que me leva a continuar a ___________________
mesmo quando sei que a intimidade de um olhar não foi nunca suficiente para fazer ninguém voltar
Acreditar
É que hoje despertei com uma sensação terrívelmente assustadora.
Mesmo depois de acordado, dei por mim a acreditar...
terça-feira, fevereiro 15, 2005
Impossível?!
finalmente.
dá-me a tua mão...
vamos sonhar neste impossível...
terça-feira, fevereiro 08, 2005
O Obcessivo
sexta-feira, fevereiro 04, 2005
Inside
Imagem: Elsa Dax
Não vale a pena procurar a chave para os problemas, no exterior. A resposta, bem como todo o esquema do enunciado, está na nossa cabeça. Tudo o que penso existir fora de mim, não existe como facto. Tudo é interior.
Metamorfose
Imagem: Vicent Chong
Por mais que tente esquecer e apagar, a dor continua viva. O sentimento que se projecta sob uma determinada imagem, não é mais do que uma severa auto-punição camuflada. Surge sempre na sequência de uma qualquer acção que se nos assume como gravosa. A intensidade da repressão interior reflecte-se na dimensão dos destroços.